À Volta do Vinho (2)
O título deste post corre o risco de se tornar um best-seller aqui no blog. Uma espécie de sequela de sucesso hollywoodesca. Já é a segunda vez que escrevo sobre este restaurante e tenho um pressentimento de que não será a última. O motivo desta vez foi a divulgação dos vinhos da Montez Champallimaud (MC). O evento decorreu esta sexta-feira. Concorrido. Acredito que um dos factores que explicam a forte afluência é o facto de um dos vinhos em prova custar cerca de duas vezes o preço do jantar.
A ementa da noite consistiu no seguinte:
Recepção
Rissóis de Camarão (Cheguei meia hora atrasado e já não provei nenhum. “Para a próxima chega a horas!”)
Tostas com Salmão Fumado (Não foi o salmão fumado que mais gostei até hoje. Nem andou perto. Mas também é verdade que não sou um grande consumidor.)
Tostas com Requeijão (Bom requeijão.)
Paço do Teixeiró branco 2005
Deve ser algum sentimento de culpa, vergonha, inferioridade ou um mix de tudo isto e mais alguma coisa que me impele, sempre que discurso sobre um vinho branco, a fazer este pequeno preâmbulo: “Não aprecio brancos, não sei avaliar brancos!”. Dito isto, tinha um aroma ligeiramente doce a ananás. Na boca pareceu-me apresentar uma acidez elevada que se acentuava exponencialmente com o aumento da temperatura do vinho no copo. No inicio ainda bebi mas fui incapaz de finalizar a última metade. Como curiosidade o facto do vinho ter sido engarrafado nesse mesmo dia e portanto sermos os primeiros “consumidores” a prová-lo.
Entrada
Folhado de Coelho com Puré de Cenoura (Excelente folhado. Gostei bastante do recheio de coelho. Nada seco. Como não gosto de puré de batata e não nutro simpatia por purés em geral - já em bebé não comia papas – estava de pé atrás em relação ao puré de cenoura. Surpresa. Até gostei. Quer dizer, não é coisa que faça questão de pedir numa outra ocasião mas comi com algum agrado. Ligeiramente adocicado, provavelmente indissociável do facto de ser feito de cenoura.)
Qt. Cotto 2003
Na minha mesa ou melhor, na minha secção de mesa (mais à frente já explico porquê) fui o primeiro a provar o vinho. Aroma estranho. Não consegui identificá-lo mas não gostei nada. Desconfiado, pedi a uns amigos que se tinham servido de outra garrafa para cheirar os seu copos. O cheiro era igual. Alguns atiravam que cheirava a ferro, outros a ferrugem. O representante da MC confirmou o aroma metálico. A mim o que me cheirou, e o melhor que consigo descrever, foi a um “borrachum” verde e adocicado. Na boca é magro e acídulo. Em contra-ciclo do que foi o ano de 2003 no Douro para a maioria dos produtores. Sem fruta e sem dar prazer a beber, assim que a temperatura da sala subiu, e por conseguinte a temperatura do vinho (que me pareceu que já não foi servido à temperatura correcta), ficou intragável. Deixei-o quase todo no copo.
Prato de Carne
Entrecôte de Novilho no Forno (Este prato é complicado de avaliar. Ou se gosta de carne crua ou não. Eu não gosto. Até como carne um pouco mal passada. Mas esta peça de novilho, tirando o centímetro inicial, era carne completamente crua. A qualidade da carne não discuto. Dirão os leitores gastronomicamente mais esclarecidos: “então se não gosta de carne crua porque foi ao jantar?” Ignorância, por um lado, e por querer provar o vinho que acompanhava o prato, por outro. Um aparte: a batata frita palha do pacote até fica bem num cachorro-quente mas como acompanhamento de um prato de carne supostamente mais elaborado já tenho as minhas dúvidas.)
Qt. Cotto Grande Escolha 2001
A grande expectativa da noite. O vinho porque todos foram ao jantar. Nunca tinha bebido um Grande Escolha da Quinta do Cotto. Acompanho as notas de prova das revistas da especialidade e quem o faz como eu sabe que não é um vinho que, nos últimos anos, tenha dado que falar pela sua qualidade. Tem se falado mais, se calhar, sobre o preço excessivamente elevado que apresenta se comparado com excelentes vinhos proveniente dos seus vizinhos durienses. Aroma dominado pela madeira , mas não madeira nova. Ou seja, não cheirava a baunilha. Na boca é austero, herbáceo e termina bastante seco a madeira. Pelos vistos os 24 meses que passou em barrica marcaram-no muito e essas marcas vão custar a desaparecer. Não aprecei.
Tive uma conversa animada e construtiva com o representante, no jantar, da Montez Champallimaud, Nuno Rodrigues, que muito pacientemente, apesar de por vezes ter sido um pouco mais “assertivo” nas críticas que fiz, explicou as ideias que têm para o futuro do Grande Escolha e a necessidade que sentem de fazer um vinho que vá de encontro aos gostos do mercado actual.
Sobremesa
Queijo da Serra (Agradável, sem ser dos mais fortes de sabor. Quem não comeu a carne vingou-se no queijo e nas tostas.)
Champallimaud Vintage 2001
Nunca tinha provado um vintage da MC. Faz-se em poucos anos e em poucas quantidades. A crítica especializada também não enaltece as sua virtudes e com isso contribuía para a falta de curiosidade dos consumidores. Ninguém se esforça para o encontrar. Na apresentação do vinho feita antes da prova (habitual neste tipo de eventos) o representante da MC explicou que os vintage não são aposta da casa. Fazem um vintage diferente (aliás é vendido em garrafa normal de vinho tinto). Menos estruturado, para beber novo e com o grau alcoólico mínimo para poder ser declarado. Seguiu-se a prova. Cor vermelho vivo, no aroma ressalta um aroma a cerejas encarnadas. A boca é dominada pelo final alcoólico. A falta de corpo e estrutura potencia a sensação de álcool na boca. As pessoas na minha mesa acharam todas o vintage muito alcoólico quando o objectivo da MC é fazer o contrário. O facto do vinho ter apenas 19,5º ao contrário do normal 20º ou 20,5º não é suficiente (muito longe disso) para compensar a falta de matéria apresentada.
Cheesecake (O cheesecake tem sido uma sobremesa que nos últimos anos ganhou uma popularidade enorme. Já não há restaurante que não a tenha na sua lista de sobremesas. É isso e mangas. O problema é que nem sempre são grande coisa. Quer o cheesecake quer as mangas. Este posso afirmar que é muito bom. Boa tarte, bom recheio e bom molho de framboesa. Com uma excelente acidez que corta o habitual excesso de doçura deste tipo de caldas.)
No geral, foi um jantar que valeu mais pela experiência e pela satisfação da curiosidade enófila do que pelo prazer proporcionado. No fim do jantar, estive, mais dois amigos resistentes, à conversa com o dono do restaurante, Filipe Gaivão. Trocámos impressões sobre o jantar e os vinhos apresentados. Não será portanto surpresa total, alguns dos reparos que aqui vou fazer:
- A recepção das pessoas para jantar tem que ser efectuado de outra forma. Bem sei que o restaurante é pequeno. Mas fazer a recepção no espaço exíguo da entrada obriga a que as pessoas tenham que fugir para a saída para conseguirem algum espaço para respirar.
- Não sei se é costume juntar as mesas em três grandes filas nos dias de apresentação de vinhos, pois foi o meu 1º jantar deste tipo no restaurante, ou se esta disposição resultou da necessidade de acomodar todas as pessoas face grande afluência. A verdade é que não apreciei particularmente. Principalmente quando o prato de carne não é servido individualmente mas sim num tabuleiro de madeira “comunitário” em que as pessoas são forçadas a dividir o seu conteúdo de uma forma mais ou menos equitativa. Ora efectuar essa divisão com pessoas que não conhecemos provoca sempre algum acanhamento e constrangimento desagradáveis.
- Parece-me que os vinhos têm sido servidos a uma temperatura algo elevada. Neste particular devemos exigir mais de um restaurante com pretensões superiores. Principalmente, pretensões vinícolas. No anterior jantar que aqui fiz, já tinha tido esta sensação, mas o facto de neste jantar haver casa cheia fez disparar a temperatura da sala e por conseguinte a temperatura do vinho. Este problema tornou-se mais evidente.
- Os copos utilizados são bons. Mas pelos vistos não são suficientes para jantares repletos como este. O copo de vinho do porto que me “calhou” e a mais uma dúzia e meia de pessoas não me parece o mais indicado quer do ponto de vista do formato quer do ponto de vista do tamanho. Deve ser mais indicado para prova de uísques.
PS – Só no final do jantar e após este ter saído é que fiquei a saber que o nosso colega do blog saca-a-rolha esteve presente. Foi uma pena não nos termos conhecido. Fica para um próximo evento.
5 comentário(s):
Demasiado polido... a boa educação assim obriga. Mas eu não esqueço a batata "palha" de pacote.
Uma pessoa não deve esquecer mas tb deve dar outra oportunidade. Principalmente qd se trata de pormenores de menor importância. Só não perdoava se o vinho servido fosse de "pacote".
não me parece ue a batata seja de pacote... se calhar é feita lá e fica "parecido igual" á do pacote...
Caro Rui,
Tem razão, também estive no jantar. E também tem razão quando escreve que foi pena não nos termos encontrado. Terá de ficar para a próxima.
Também vou escrever sobre o jantar, tenho opiniões parecidas com as suas, mas fiquei com melhor impressão do QC 2003 (seria a minha garrafa?).
Próxima quarta estarei no aniversário da garrafeira Venha à vinha na Via Venetto (À João XXI) com provas de vinhos...
NOG
Caro Nuno,
ainda não será desta que nos iremos encontrar, pois não posso estar presente nesse evento.
Quanto ao QC 2003, não me parece que tenha sido da garrafa. Provei pelo menos de 3 diferentes. Não gostei mesmo nada, e não fosse pelo facto de nós aqui no blog ainda não termos um símbolo para zero rolhas e provavelmente teria sido essa a nota. :-)
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